Não viveram os que ficaram corroídos pela inveja do sucesso de alguém e se encheram de despeito.
Não viveram os que sempre entupiram os seus corações com o mais monstruoso dos ódios irracionais.
Não viveram os que nunca sentiram a presença silenciosa e emocionante da saudade.
Não viveram os que não se solidarizaram com os sofredores e os consolaram.
Não viveram os que procuraram corromper a pureza, a inocência, as virtudes, esmagando beija-flores, lírios, camélias e rosas.
Não viveram os que não acariciaram uma criança, não a beijaram, não brincaram com ela, ou lhe negaram um sorriso, uma palavra de ternura.
Não viveram os que, em nome da verdade, destruíram estupidamente as ilusões das almas ingênuas e sonhadoras.
Não viveram os que aplaudiram com cinismo o erro, o vício, a injustiça, o roubo, o crime, a venalidade, a corrupção, a prostituição.
Não viveram os que não amaram a cultura, a música, a poesia, a obra de arte, a beleza.
Não viveram os incapazes de ter pena de um infeliz, de um desgraçado, e que transformaram os seus corações em barras de gelo.
Não viveram os egocêntricos, que se preocuparam apenas com o seu bem-estar e fizeram de suas vidas uma auto-idolatria, sem ligar para mais ninguém.
Não viveram os jovens que zombaram dos velhos, e os desrespeitaram com a impaciência, a injúria, os cretinos atos de grosseria.
Não viveram os mesquinhos, que se mostraram pequeninos no modo de agir em relação aos nossos semelhantes e jamais tiveram um gesto de nobreza, de altruísmo, de desprendimento.
Não viveram os que só queriam “relaxar e gozar” e que acharam que o principal é encher o estômago, dormir bem, defecar bem e ter voraz e insaciável apetite sexual.
Não viveram os que só se preocuparam com os bens materiais, em detrimento dos bens espirituais, e que converteram os seus corações em metálicas caixas registradoras, cujo som é assim: dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro.
Não viveram os que, praticando uma ação vil, traíram a confiança de quem neles acreditava e assim emporcalharam as suas almas, cobrindo-as com fedorentos mantos de excremento.
Não viveram os falsos, os hipócritas, que Cristo comparou a “sepulcros brancos, caiados por fora, mas cheios de ossos de mortos e de podridão por dentro”.
Não viveram os que foram racistas, preconceituosos, e que por orgulho tolo, por se sentirem superiores, humilharam e maltrataram pessoas.
Não viveram os que não sentiram a dor indescritível de perder, levada pela morte, uma pessoa querida, pois como disse o poeta Francisco Otaviano, em versos nos quais a verdade resplandece:
Quem passou pela
vida em branca
nuvem e em plácido
repouso adormeceu,
quem não sentiu
o frio da desgraça,
quem passou pela
vida e não sofreu,
foi espectro de
homem, não foi
homem, só passou
pela vida, não viveu.
Meus amigos, viver é emocionar-se, no bom sentido, é sentir que temos alma, amor, sonhos, esperanças, coração, lágrimas, bondade, piedade, saudade. Quem não possui tudo isto não está vivo, é como um campo desprovido de flores, árvores, pássaros, sombras aconchegantes, só habitado por vermes, ossadas, escorpiões, mortíferas cobras geradas na região do horror e do espanto.
2 comentários:
Caraba, só aos 75 anos fui saber quem é Fernando Jorge. A vida é injusta, como disse Kennedy,pois me escondeu até agora essa alma lúcida.
Caramba, só aos 75 anos...
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