domingo, 5 de agosto de 2012

O AUXÍLIO-CUECA


A Justiça determinou: a Assembleia Legislativa de São Paulo está impedida de pagar o auxílio-paletó, correspondente a 40 mil reais em duas parcelas, aos 94 nobres representantes do povo da terra de Rodrigues Alves.
Eu chamava esse auxílio (por achar mais apropriado), de auxílio-cueca. Era um salário-extra, pago no começo e no término de cada ano, a todos os senhores deputados do Legislativo paulista (o qual se caracteriza pela imensa austeridade), poderem comprar roupas novas, camisas, gravatas, paletós, calças, meias, e principalmente, acredito, lindas e cheirosas cuecas de seda, de cor marrom (da cor das fezes), ou azul, ou vermelha, ou cor-de-rosa gay, ou verdes-e-amarelas, como prova indiscutível de berrante patriotismo, de demagógoca paixão pelo Brasil...
Em sentença de oito páginas, o meritíssimo juiz Luís Fernando Camargo de Barros Vidal, da 3ª Vara da Fazenda Pública da capital paulista, acolheu a ação civil do Ministério Público Estadual e impôs, ao Poder Legislativo, o corte da verba que é denominada “ajuda de custo”, também conhecida como “verba de enxoval”.
A ação para eliminar o auxílio-cueca tornou-se uma iniciativa, em 2011, dos promotores Saad Mazloum e Sílvio Antônio Marques, membros da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, braço do Ministério Público cujo escopo é realizar investigações sobre atos de desmandos, de corrupção, de improbidade administrativa.
O auxílio-cueca foi previsto no artigo 1º da Lei 11.328, de 2002, e no artigo 88 do Regimento Interno da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, mas os promotores Saad e Sílvio, na ação, mostraram a inconstitucionalidade da vantagem instituída. Além de violar o artigo 18 da Constituição do Estado, no entender de ambos, o auxílio-cueca “feria de morte a moralidade”.
Após esse “humanitário” auxílio ter sido suspenso, o deputado Barros Munhoz, do PSDB, presidente da Assembleia, declarou de modo firme, sob o domínio de uma raiva mal disfarçada:
“Não enxergo problemas no benefício. Existem coisas muito mais imorais em outras instituições do nosso país. O auxílio é legal, é claro, é transparente, sem nada de errado”.
Sua excelência se expressou de forma infeliz, porque salientou que há coisas mais imorais em nossa pátria. Ora, então eu pergunto: o auxílio-cueca, por ser “menos imoral”, deixa de ser imoral?
Juro, amigo leitor, eu compreendo a oculta indignação do deputado Barros Munhoz. E sinto enorme pena dos seus 93 colegas da Assembleia Legislativa de São Paulo, pois cada um deles, pobrezinhos, só conta, todos os meses, com o auxílio moradia de 2.250 reais; com o curto salário de 20 mil reais; com os ridículos 23 mil reais para certos gastos, como Correios, gasolina e compra de jornais; com a miséria de apenas 94 mil reais mensais, destinados à verba de gabinete, ao pagamento dos pouquíssimos 32 assessores de cada um...
Vejam agora os milhões e milhões de reais que os 94 parlamentares de São Paulo custam aos cofres públicos. Só o auxílio-cueca custava, todos os anos, mais de 3 milhões de reais a esses cofres.
Reprovo a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo por ter decidido não recorrer da sentença judicial que acabou com o poético auxílio. Tal medida, tomada pela Mesa Diretora, teve o respaldo unânime dos líderes de todos partidos.
Deputado Barros Munhoz e demais parlamentares, eu sustento: os senhores foram duros, insensíveis, maus, pelo fato de não contestarem o fim do abnegado auxílio-cueca, pois causaram uma grande mágoa às perfumadas cuecas paulistas de seda. As coitadinhas estão infelizes, pesarosas, chorando. Elas sentiam tanto orgulho em resguardar as vossas bem nutridas bundas! Quem as consolará, quem? O Paulo Salim Maluf? O prefeito João Izael, de Itabira, que sofre de bibliofobia aguda?

A MÁQUINA CONTRA A CORRUPÇÃO


Desfechado o Golpe de 1964, os militares alçaram a bandei­ra da luta contra o comunismo e a corrupção. No entanto, nunca houve tanta corrupção no pais como a que nós vimos ao longo do chamado “Movi­mento de 31 de março de 1964”. Espalhou-se o fedor das mordomias, das sinecuras, dos peculatos, dos estarrecedores escândalos financeiros cau­sados por empresas falidas, mas ajudadas pelo Banco Central, o cheiro nauseabundo dos casos do Halles, do Grupe Lume, da Crecif, da Audi, da Copeig, da Capemi, da Copersucar, da Coroa-Brastel, da Corretora Laurea­no. Só esta, por exemplo, trouxe prejuízos à nação da ordem de 46 bi­lhões de cruzeiros, uma soma que permitiria construir, de maneira folgada, cerca de 4.400 casas populares.
            Um dos líderes no Senado da campanha pela redemocratiza­ção, o gaúcho Paulo Brossard, sintetizou tudo na seguinte frase, em 1978:
“A democracia neste pais é relativa, mas a corrupção é absoluta.”
Tancredo Neves, no dia 16 de janeiro de 1985, foi eleito presidente da República. Eu liguei a minha televisão nesse dia e vi um repórter da TV Globo perguntar isto ao Fernando Henrique Cardoso, Iá no Congresso Nacional:
-Professor, agora, com a eleição do doutor Tancredo, ainda vai haver corrupção no Brasil?
Fernando Henrique respondeu, muito eufórico:
-Ah, isto não, isto não, nunca mais, nem daqui a cem anos!
O repórter quis saber:
-E por quê?
Verboso como sempre, o Fernando Henrique explicou:
-Não vai haver mais corrupção no Brasil porque nós, do PMDB, montamos uma esplêndida máquina para fiscalizar a máquina do Es­tado. A nossa máquina vai funcionar dia e noite, sem parar. Qualquer ato de corrupção será imediatamente descoberto e denunciado por nós!
Essa engrenagem, se ela existiu, nunca funcionou, pois do contrário, de 1990 a 1992, os deputados Cid Carvalho, Manoel Moreira e Genebaldo Carvalho não teriam lesado o Orçamento Federal. Citei apenas os três porque eles eram do PMDB, do partido que havia montado, segundo Fernando Henrique, a tal máquina capaz de denunciar os atos de corrupção. Aliás, como informa a edição do dia 28 de junho de 1990 do jornal O Estado de S. Paulo, o senhor Almir Candury, do PMDB de Rondônia, candi­datou-se a deputado e prometeu:
            -Vou ser o mais corrupto dos deputados. Estou comprando votos e disposto a fazer qualquer acordo, com papel passado em cartório, para me eleger.
Depois ele acrescentou:
-Quero ficar milionário com o meu mandato... O importante é que, de fato, sou o candidato da corrupção. Roubar todos roubam hoje em dia no Brasil.
Incrível, quanta desfaçatez! Cadê a máquina do PMDB contra a corrupção, ó Fernando Henrique? Ela é tão eficaz como a máquina de explorar o tempo do livro de H. G. Wells? E me responda, amigo leitor: acha que eu exagerei, quando disse que o outro nome do Brasil é Corruptolândia?