Ronaldo Andrade é um poeta de talento. Nasceu em
Pernambuco, no ano de 1979, e vive em São Paulo, mas à semelhança de muitos
intelectuais de valor, de talento, que se tornaram famosos, ele trabalhou em
vários setores. Foi ajudante de caminhoneiro, fabricante de cal na cidade do
seu nascimento, Santa Maria do Cambucá. E no solo do “caçador de esmeraldas”,
do bandeirante enaltecido por Olavo Bilac, exerceu estas profissões: servente
de pedreiro, pintor de residências, camelô, balconista numa adega, empregado
num empório.
Autodidata, concluiu os seus primeiros estudos na capital
de São Paulo. Hoje está matriculado em curso de Letras, pois Ronaldo Andrade
ama os livros, a cultura, a literatura, enriquecendo incessantemente, com
conhecimentos ecléticos, a sua inteligência viva, brilhante. Ele pensa como o
poeta e ensaísta inglês Matthew Arnold (1822-1888), o arguto ensaista de Culture and anarchy:
“A cultura é a nossa tomada de conhecimento do melhor que
se tem sabido e dito no mundo, e portanto da história do espírito humano.”
(“Culture, the acquainting
ourselves with the best that has been know and said in the world, and thus with
the history of the human spirit”)
O ardente amor de Ronaldo Andrade pela cultura o
impulsionou a se transformar em leitor voraz, em assíduo frequentador de sebos
e livrarias. Se corresse a notícia de que esse bibliômano havia desaparecido,
sem deixar vestígios, não seria difícil encontrá-lo: decerto o achariam numa
livraria da Paulicéia. Ronaldo não é como quase todos os nossos políticos que,
conforme eu disse certa vez ao crítico Agrippino Grieco, só entram em livrarias
nos dias de chuva, de forte temporal, a fim de não apanhar gripes ou pneumônias.
Ronaldo não sofre de bibliofobia aguda. Ele sofre de bibliofilia aguda.
A sua vocação para versejar, poetar, nasceu quando era
menino, ao ouvir as emboladas, os improvisos dos repentistas nordestinos. Então
começou a gostar dos versos rimados, das poesias fluentes, espontâneas,
naturais como os gorjeios dos sabiás de Gonçalves Dias nas palmeiras
brasílicas. Aliás, Ronaldo até deseja ser pássaro, conforme revela nesta sua
quadra:
“Eu chego a
perder o sono
Pensando em ti, minha flor,
Não quero ser seu dono,
E sim o seu beija-flor.”
Sim, Ronaldo quer ser pássaro, como Cruz e Sousa:
“Ah, ser
pássaro, ter toda a amplidão dos ares
para as asas abrir, ruflantes e nervosas,
dos parques através e dos moitais de rosas,
nos floridos jardins, nas hortas e pomares.
Ser pássaro, cantar, subir, voar na altura,
pelos bosques sem fim, perder-se nas florestas,
das folhagens do campo em meio da espessura,
das auroras de abril nas cristalinas festas.”
Os
seguintes versos desse poema “Ser pássaro”, do autor dos Broquéis,
expressam a aspiração secreta de Ronaldo:
“Voar, voar, voar, voar eternamente,
extinguir-se a voar,
no matinal gorjeio,
é ser pássaro, é
ter em cada asa fremente
um sol para
aquecer o frio de algum seio”.
Mas por
amar todos os seres da natureza, como um verdadeiro panteísta, Ronaldo Andrade
também quer ser abelha. Vejam esta quadra, com o título de “Boquinha
aveludada”:
“Queria ser
uma abelha,
Pra pousar nessa boquinha,
Aveludada e vermelha,
Que parece uma florzinha”.
Poetas
cândidos, do tipo do Ronaldo, usam os bichos para produzir imagens originais,
como na seguinte quadra do poema “O marroeiro”, de Catulo da Paixão Cearense:
“Os pesinho
da cabôca
Quando dançava o baião,
Parecia dois pombinho
A mariscá pulo no chão!”
Thomas Antônio Gonzaga, na lira XXX, assim cantou os olhos
da sua adorada Marília:
“Os astros
que andam
Na esfera pura,
quando cintilam
na noite escura,
não são humanos,
tão lindos como
seus olhos são,
que ao sol excedem
na luz que dão.”
Pois bem, a quadra intitulada “Pergunte ao coração”, do
nosso brasileiríssimo Ronaldo Andrade, é tão bela como os versos aqui
reproduzidos da lira de Gonzaga:
“Os olhos
da noite estão
Onde os seus não podem ver,
Pergunte ao seu coração,
Se ele sabe lhe dizer.”
A sonoridade dos versos de Ronaldo é explicável, porque o
nosso troveiro começou escrevendo letras de música, com a ambição de ser
compositor. Entretanto, no fundo, Ronaldo é um poeta músico, como o foi
Vinicius de Moraes. Na minha opinião, a poesia é a música das palavras e a
música é a poesia dos sons.
Parece que o meu amigo pernambucano coloca no papel,
frequentes vezes, as trovas que escuta de um anjo vindo do Paraíso e apaixonado
por uma terráquea... Contudo, aqui entre nós, amigo leitor, a musa de Ronaldo é
a sua esposa Amanda.
Ronaldo Andrade, você é um poeta singelo, com P grande, e
me orgulho de ser seu amigo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário