É uma doença antiga do Brasil a corruptite, mas ela não prejudica os que carregam o seu vírus no sangue. Só causa danos ao povo, à massa sofrida dos trabalhadores mal remunerados, a uma gente pobre e injustiçada.
Doença crônica da nossa pátria amada, salve, salve, a corrupti-te levou um grande orador, o padre Antônio Vieira, a soltar estas afirmativas, perguntas e respostas num sermão pronunciado em 1665:
“Perde-se o Brasil (digâmo-lo em uma palavra) porque alguns ministros de Sua Majestade não vêm cá buscar nosso bem, vem cá buscar nossos bens... EI-Rei manda-os tomar Pernambuco e eles contentam-se com o tomar... Toma nesta terra o ministro da Justiça? Sim, toma. Toma, o ministro da Fazenda? Sim, toma... Toma o ministro da República? Sim, toma. Toma o ministro do Estado? Sim, toma..."
Autoridades do rei dom José I, na época do Brasil Colonial, exibiam as suas gananciosas unhas aduncas até na palma da mão, e os outros figurões também, como os contratadores de diamantes. Esses contratadores arrendavam do Estado as jazidas. João Fernandes de Oliveira, um deles, apaixonou-se pela negra Xica da Silva e tinha palácios, templos, edifícios opulentos, minas de ouro. Uma riqueza oriunda das infrações que ele cometia contra o erário do reino. Sabendo disso, o marquês de Pombal o obrigou a pagar, ao Estado português, a imensa quantia de 11 milhões de cruzados.
Fiscais e meirinhos se locupletavam às custas de safadezas, mormente na barroca Minas Gerais do século XVIII.
Se Brasil Colonial já era um país de corruptos, o Brasil Império não ficou atrás, também foi uma Corruptolândia.
Narra Moreira de Azevedo no seu livro “Mosaico brasileiro” (Editora Garnier, Rio de Janeiro, 1869, página 135), que tendo ocorrido um roubo no Tesouro Público do Império, uma pessoa transmitiu esta notícia ao marquês de Maricá. O assalto, observou o informante, havia sido praticado “por uns miseráveis”. Indignado, o marquês de Maricá respondeu:
- Miseráveis! Miseráveis! Ah, meu caro amigo, o roubo de milhões enobrece os ladrões.
De fato, em larga escala, a desonestidade no Brasil dava foros de nobreza. Filosofando, o povo dizia:
“Quem rouba um tostão é ladrão. Quem rouba um milhão é barão.”
Cínicos e audaciosos, os corruptos se multiplicavam nas épocas de dom Pedro I e de dom Pedro II. E os monarquistas não me venham com essa história de que nos reinados de ambos só se via, em toda parte, a decência, a honradez, a probidade administrativa. O britânico Henry Coster, autor do livro “Travels in Brazil”, publicado em Londres no ano de 1816, afirmou o seguinte nessa obra: aqui, no tempo de dom Pedro I, eram comuns o peculato, a corrupção, vários delitos, porém os autores desses crimes escapavam da Justiça. Van Halle, outro europeu, ficou escandalizado em 1881, quando soube que o governo de dom Pedro II reintegrara no serviço público alguns agentes de polícia exonerados por desonestidade.
Após a queda do Império em 1889, os corruptos da República substituiram em numerosos postos os corruptos do regime monárquico. Ratos ocuparam os lugares de outros ratos. Eles, como os da mesma espécie do Segundo Reinado, passaram a navegar calmamente nas águas mansas da Corruptolândia. Ao ver essa afrontosa tranqüilidade da rataria, o austero barão de Lucena, ministro da Fazenda, escreveu estas palavras numa carta enviada no dia 4 de novembro de 1891 ao seu amigo Cesário Alvim, governador de Minas:
“...em nosso Brasil não há falta de homens inteligentes e ilustrados; a falta que há é de homens de caráter e patriotas!”
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