sexta-feira, 29 de maio de 2020

MAIS ERROS SOBRE SANTOS DUMONT


Vou mostrar mais erros sobre Santos Dumont. Eu os descobri por acaso em muitos livros, em dicionários bem conhecidos, em várias enciclopédias famosas. Afinal de contas pesquisei durante 15 anos para poder escrever a minha biografia do nosso genial inventor, cuja 5ª edição será lançada pela Geração Editorial.

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            Isaac Asimov, nascido em Petrovich, na Rússia, em sua Biographical Encyclopedia of Science and Technology, traduzida para o português com o título de Gênios da humanidade (Bloch Editores, 3 volumes, 1974), produziu estes erros sobre Santos Dumont:
I) O inventor conquistou o Prêmio Deutsch em julho de 1901 e ganhou, por este motivo, 123.000 francos, distribuídos entre seus mecânicos, operários e auxiliares.
Está errado, O prêmio foi obtido por causa do voo de 19 de outubro de 1901, no dirigível Nº 6. Santos Dumont recebeu 129.000 francos, havendo entregue 50% aos pobres da capital francesa.
II) Após acumular "esforços e conhecimentos aerodinâmicos”, o inventor construiu em 1904 o 14-bis, usando um motor a explosão de 24 HP.
Está errado. O 14-bis é de 1906 e o seu motor possuía 50 HP. No ano de 1904, Santos Dumont construiu o dirigível Nº 10, chamado “ônibus aéreo”, pois apresentava lugares para quatro ou cinco passageiros, em nacelles individuais.
III) Santos Dumont, com o Blériot XI, no ano de 1909, “fez a primeira travessia sobre o Canal da Mancha e sobrevoou os Alpes pela primeira vez" (volume 3 da edição brasileira da obra de Asimov, página 568).
Está errado. O informe de Isaac Asimov é um disparate: Santos Dumont nunca voou sobre o Canal da Mancha e também jamais viu os Alpes, quando comandava o 14-bis ou a Demoiselle. Quem efetuou num avião a primeira travessia do Canal da Mancha, segundo a história da Aeronáutica, foi Louis Blériot, em 25 de julho de 1909. A façanha lhe propiciou um prêmio do Daily Mail, o grande jornal britânico. E quem sobrevoou os Alpes pela primeira vez, a mais de 2.500 metros de altura, não foi o brasileiro Santos Dumont e sim o peruano Géo Chavez, no dia 23 de setembro de 1910, rasgo de audácia que lhe custou a vida. Consultar as páginas 78 e 86 do volume I da obra La conquête de l’air, de A. van Hoorebeeck, publicada em 1967 pela coleção Marabout Université, dirigida por Serge Godin e Jean-Jacques Schellens.
A nota da Editora Bloch acentua: Isaac Asimov, em 1965, recebeu o Prêmio James T. Grady, da Sociedade Americana de Química, devido a sua enorme ajuda à divulgação do progresso das ciências. Mas se os outros verbetes da enciclopédia desse autor se acham repletos de fatos absurdos, como se vê na parte sobre Santos Dumont, pobres Science and Technology! E aqui não fica mal enviar esta pergunta ao sr. Asimov, depois de ler os seus desconchavos a respeito do nosso inventor:
- Into what an abyss of errors are you falling?
(Em que abismo de erros vós caístes?)

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Carolina Nabuco na página 36 de Oito décadas, livro de memórias do ano de 1973, lançado pela Editora José Olympio, assim evoca um dos feitos de Santos Dumont:
“Brilhou novamente em 1904 com o voo que ficou histórico, o do pri­meiro avião mais pesado que o ar, façanha assistida por um grupo de curiosos no campo de Bagatelle, em Paris”.
A filha de Joaquim Nabuco cometeu o mesmo erro da Novíssima Enciclopédia Delta Larousse e da enciclopédia O mundo do saber, pois o voo pioneiro do 14-bis, ocorreu em 23 de outubro de 1906.

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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.

quinta-feira, 21 de maio de 2020

PUXA, ELE ESTAVA ATÉ NO AVIÃO


O Dicionário Houaiss da língua portuguesa, lançado pela Edito­ra Objetiva, do jornalista Roberto Feith, custou quinze anos de trabalho, teve 34 redatores e a colaboração de cerca de 150 especialistas. A editora investiu mais de 5 milhões de reais nessa obra, que recebeu o apoio financeiro de várias empresas, como a PETROBRAS, a TELEMAR, a EMBRATEL, e até do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Para poder imprimir o dicionário, a Objetiva também obteve a ajuda econômica da Fundação Calouste Gulbenkian e do Banco Espírito Santo, de Portugal.
­Centenas de verbetes, no calhamaço da Editora Objetiva, apresentam o estilo anguloso e cheio de ziguezagues do Antônio Houaiss, autor que era um mestre na arte de escrever corretamente mal. Leiam as seguintes palavras do prefácio desse filólogo:
“Não se pode fugir à evidência de que cada utente da língua é senhor de determinado campo limitado do seu universo lexical, mas pode ampliar o seu senhorio na medida em que disponha de dicionários...”.
Antônio Houaiss, quando escrevia, não tinha bom gosto, senso estético. Vejam como é horrível esta expressão: “cada utente da língua”. O vocábulo utente é sinônimo de usuário e é pouco empregado no Brasil, como o próprio dicionário reconhece, na página 2.816. Então por que usar o feíssimo utente?
Mais uma prova do mau gosto do Antônio Houaiss: o uso da expressão "ampliar o seu senhorio”. Esta última palavra é sinônimo de domínio. Ora, não é melhor dizer "ampliar o seu domínio"? Repito, o Antônio Houaiss, autor de um indigesto e soporífero estudo sobre a "pluralidade linguística”, era um mestre na arte ele escrever corretamente mal.
Homem de 62 anos, advogado de barbicha, com cara de primeiro­-ministro britânico, o cidadão Mauro de Salles Villar, coordenador do Houaiss e sobrinho do filólogo carioca, procurou imitar o estilo do tio na apresentação da obra. Ele gosta de usar estas palavras: infixos, grafemas, interpositivos, pospositivos. Também ama as seguintes expressões: sintagmas locucionais, informesonomasiológicos, registro diacrônico das acepções, descodificação semântica. Mauro quer escrever bem, mas de vez em quando se esquece de colocar os pronomes nos seus devidos lugares:
“Deixe-se, com isso, o processo da descodificação semântica para a competência linguística do consulente - exatamente aquele cuja dúvida levou a recorrer ao dicionário”.
Está faltando na frase o pronome o, antes da terceira pessoa do pretérito perfeito do indicativo do verbo levar:
“... aquele cuja dúvida o levou..."
­Reprovo, no texto acima do doutor Mauro, a assonância consulente-exatamente, reveladora de falta de senso crítico e de um bom ouvido. É o estilo ENTE-ENTE.
O sobrinho de Antônio Houaiss ignora que a conjunção, todavia deve ser acompanhada de vírgula, se houver necessidade de ênfase ou de pausa. Eis como ele a empregou:
“Todavia isto é ocorrência comum a todos os dicionários...” (página XV).
Ficaria correto se ele, após a conjunção, tivesse colocado a virgula:
"Todavia, isto é ocorrência...”.

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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.

quinta-feira, 14 de maio de 2020

CONTINUA O MARTÍRIO DO PAI DA AVIAÇÃO


No ano do centenário do voo do 14-Bis, aparelho com o qual Santos Dumont provou que é o inventor do avião, se tornou oportuno mostrar os erros sobre o nosso genial patrício, publicados em livros, dicionários e enciclopédias.

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No livro Nosso Brasil, aparecido em 1936, o escritor Plínio Salgado infor­mou no capítulo “História de balões e aeroplanos”, a propósito de Santos Dumont:
"Resolveu voar numa nave mais pesada do que o ar. Construiu o primei­ro aeroplano, ao qual deu o nome de Demoiselle."
Plínio Salgado afirma que Santos Dumont fez isto logo após contornar a Torre Eiffel num balão em forma de charuto, Ora, tal fato ocorreu no dia 19 de outubro de 1901. com o dirigível nº 6. A vitória lhe deu o Prêmio Deutsch, ele ganhou a importância de 100.000 francos, mais 25.000, acrescidos de 4.000 de juros, totalizando 129.000 francos, dos quais 50% foram distribuídos entre seus auxiliares, e os restantes 50%, entre os pobres de Paris.
O primeiro aeroplano de Santos Dumont não é o Demoiselle, cuja autonomia de voo era de quinze minutos, avião de 1907, e sim o 14-bis, criado em 1906, que lhe proporcionou a iniciativa de dirigir o primeiro voo com um aparelho mais pesado do que o ar. Daí se conclui: o chefe do Integralismo armou uma confusão, ou como diz o povo, '"trocou as bolas”.

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A Enciclopédia do curso secundário, lançada em 1941 pela Editora Glo­bo e organizada por Álvaro Magalhães, professor da Universidade de Porto Alegre, revela na página 256:
“Em 1906, tendo (Santos Dumont) abandonado as experiências com apa­relhos mais leves do que o ar, conseguiu levantar voo em seu avião, a Baga­tela, recebendo a taça Archdeacon”.
Mais uma trapalhada, como a de Plínio Salgado. O inventor abiscoitou o prêmio devido ao 14-bis e não graças à proeza do inexistente Bagatela. Quem escreveu o verbete da enciclopédia confundiu o prado de Bagatelle (onde Santos Dumont realizou o voo de 23 de outubro de 1906), confundiu esse prado com o famoso 14-Bis, o “Ave de Rapina”, aparelho cujo motor tinha 50 HP, dois carburadores e 1.500 rotações por minuto.

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Talvez baseado no erro de Plínio Salgado, o Diccionário enciclopédico de las Américas, da Editorial Futuro, de Buenos Aires, obra de 1947, forneceu esta informação sobre Santos Dumont, na página 608:
“... en 1909 efectuó el primer vuelo con una máquina más pesada que el aire, el Demoiselle, desde Saint Cyr a Buc.”
Diante da repetição desse erro, veio à nossa memória um trecho de Frei Heitor Pinto, o insigne escritor clássico do século XVI, cuja Imagem da vida cristã é um modelo de pura linguagem e de elevado estilo:
“Assim como lançando uma pedra em um grande poço se faz um círculo na água, e dele procede outro maior, e este maior faz outro mais estendido, após o qual vem outro e outros cada vez maiores quase em infinito, assim de um erro nasce outro, e este traz outro consigo maior, após o qual vem outros cada vez maiores quase em infinito, se lhe não atalham logo ao princípio”.

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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.