Os irmãos Cristian e Daniel Cravinhos, no dia 30 de outubro
de 2002, usando tacos de beisebol revestidos de ferro, assassinaram o casal
Manfred e Marisia Richthofen, enquanto ambos dormiam. Quem planejou friamente
essa morte monstruosa, com dois meses de antecedência, foi a jovem Suzane von
Richthofen, filha do casal. Motivo: os seus pais se opunham ao amor que unia
Suzane a Daniel. Pais malvados! Eles não mereciam viver! Devido a essa
imperdoável falta de compreensão do papai e da mamãe, a mocinha de rosto
angelical os condenou à morte.
Após comandar o trucidamento dos
seus pais, a meiga Suzane foi com o namorado para o Motel Colonial, a fim de
ali satisfazer o velho e imperioso instinto que perpetua a espécie humana.
No
Cemitério Redentor, da Zona Oeste da capital paulista, durante o enterro de
Manfred e de Marisia, a suave planejadora do crime debulha-se em lágrimas,
mostra como estava muito abalada. Coitadinha! Todos ali sentiram pena e
imaginaram como devia ser profunda a sua angústia, pelo fato de ter perdido os
pais daquela maneira tão selvagem, tão bárbara...
Três dias
depois, a doce órfã promove a festa do seu aniversário, à beira da piscina da
casa. Ela ri, bebe, mastiga uma deliciosa picanha, troca beijos ardentes com o
romântico Daniel. Quanta felicidade! Papai e mamãe enfim mortos, quietinhos
debaixo da terra, bem estraçalhados, comidos pelos vermes gulosos, com as suas
teimosas cabeças arrebentadas por pesados tacos de beisebol revestidos de
ferro. Oh visão comovente, encantadora!
Mas a Polícia,
esta antipática, descobriu tudo. Pronto, acabou-se a felicidade dos três
assassinos. Suzane decerto pensou assim: adeus dinheiro e casa do papai, adeus
noites sexuais no Motel Colonial, adeus ruidosas churrascadas à beira da
piscina!
A jovem ficou presa dois anos e sete meses, porém o Superior
Tribunal de Justiça libertou-a, concedeu-lhe o habeas corpus. E o referido
tribunal proporcionou, há pouco tempo, o mesmo benefício aos irmãos Cristian e
Daniel Cravinhos. Quando os dois
souberam do fato, contou um funcionário da Penitenciária Odon Ramos Maranhão,
eles riram, pularam de alegria e se abraçaram.
Roberto Tardelli, o promotor,
criticou a decisão do STJ e disse que há a possibilidade de fuga dos irmãos,
embora o tribunal negue isto. Segundo Tardelli, a prisão de ambos era legal.
Cheio de entusiasmo, Daniel pretende
voltar à faculdade de Direito, onde cursava o primeiro ano. Deseja, portanto,
tornar-se um advogado assassino... Não menos entusiasmado, o seu irmão Cristian
declarou que vai trabalhar numa oficina de motos.
Astrogildo Cravinhos, o pai dessa
dupla maravilhosa, proferiu as seguintes palavras:
-O amor de Suzane de Daniel foi o
mais lindo que já vi em minha vida. Perto desse amor, o de Romeu e Julieta vira
fichinha.
E Astrogildo acrescentou:
-Meus filhos, massacrados pela
imprensa, não tiveram direito a nenhuma defesa.
Como duas opiniões às vezes se
chocam e uma pulveriza a outra! Para mim, o amor de Suzane e Daniel foi o mais
hediondo que já vi em minha existência, pois gerou um crime teratológico.
Julgá-lo superior ao puro e belíssimo amor de Romeu e Julieta, descrito na peça
imortal de Shakespeare, não é só um absurdo, e também uma blasfêmia. Além
disso, a imprensa nunca massacrou os dois irmãos, ela apenas informou, mas Cristian
e Daniel, estes sim, guiados por Suzane, massacraram covardemente os corpos
adormecidos de Manfred e Marisia Richthofen.
As vítimas
é
que
não tiveram o direito de defesa que os dois
irmãos assassinos estão tendo..
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Escritor e
jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio
de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.