Uma coisa me identifica muito com o meu colega
Marcos Caldeira Mendonça: é a franqueza. Ele é incapaz de ocultar a verdade,
pois sabe, como Santo Agostinho, que “os que não querem ser vencidos pela
verdade, são vencidos pelo erro” (Qui
vinci a veritate nolunt, ab errore vincuntur).
Adorei quando o Marcos, no número de dezembro
de 2011 de O Trem Itabirano, exibiu
os erros de informação e de português da coleção “Grandes Mestres”, da editora
Abril. Ele declarou que precisaria de meses para relatá-los todos. No volume
sobre o pintor Claude Monet – salienta Marcos – as palavras realista, sinuoso e
impressionista, aparecem assim na página 148: ralista, sinouso e impresionista
(sem mais um s). E de modo direto, o
meu colega pergunta: estaria bêbado o revisor da coleção, o senhor Paulo Kaiser?
Seguindo o exemplo de Marcos, vou agora
apresentar vários erros resplandecentes como as labaredas de uma fogueira, que
achei em jornais e outras fontes, ao longo do ano de 2015.
* * *
Erro de Glória Kalil no título de um artigo
sobre Gisele Bündchen: “Fica, Gisele!” (O
Estado de S.Paulo, 12-4-2015). Correção: “Fique, Gisele!”, pois Glória está
dando um conselho. Fica é a terceira
pessoa do presente do Indicativo do verbo ficar:
eu fico, tu ficas, ele fica. Se fosse o tratamento tu e não o você, então
seria fica (imperativo).
* * *
Erro na afirmativa de James Green, historiador
e brasilianista americano: a elite do nosso país se mantém no poder desde o
Segundo Império (O Globo, 19-6-2015).
Correção: nunca houve no Brasil o Segundo Império. O Império foi só um. Houve,
sim, o Primeiro Reinado, de D. Pedro I, e o Segundo Reinado, do filho dele. D.
Pedro II. Tal erro já havia sido perpetrado por Álvaro Lins (1912-1970), na
segunda série do seu Jornal de Crítica.
* * *
Cacófato nesta manchete: “Uma mania que entrou
no cardápio dos cariocas” (O Globo,
26-7-2015). Eis aí, de forma bem clara, o encontro de duas palavras que
produziu outra de sentido diferente: mama.
E mama, é óbvio, pode ser o seio da
mulher, o órgão glandular característico dos mamíferos, ou a primeira pessoa do
presente do indicativo do verbo mamar.
Exemplo do emprego simples desse verbo como intransitivo: “A menina mamou e
adormeceu” (Maria da Fonte, livro de
Camilo Castelo Branco, publicado em 1885).
* * *
Erro no texto do anúncio do Governo Federal,
lido por mim em 16 de julho de 2015, nos jornais: “Avança em São Paulo, Avança
no Brasil”. Ora, se é um conselho, uma recomendação, o certo é “Avance em São Paulo, Avance no Brasil.” Aliás, soa mal, o
“Avança no Brasil”, porque dá a impressão que o Brasil precisa ser roubado,
assaltado... Quem redigiu o anúncio conhece a nossa língua tão bem como eu
conheço a língua dos egípcios da época do faraó Tutancâmon...
* * *
Erro num texto a respeito de Rubem Alves:
“quando mudou-se com a família”... (Folha
de S.Paulo, 1-8-2015). Apesar de não pertencer apenas à categoria das
conjunções, a palavra quando,
inúmeras vezes, é também advérbio e atrai os pronomes pessoais átonos (sem
acento tônico). Dou como exemplo a seguinte frase de Alexandre Herculano: “A
águia, quando se arroja sobre a presa”... Portanto o correto é “quando se mudou
com a família”...
* * *
Ao som dos gritos “Fica Dilma” (o certo é Fique Dilma”) e de “Não vai ter golpe”,
a presidenta Dilma Rousseff participou, no dia 12 de agosto de 2015, do
encerramento da Marcha das Margaridas, em Brasília. Num discurso proferido no
Estádio Mané Garrincha, ela repetiu isto diversas vezes: “Eu comprimento fulana!
Eu comprimento sicrana! Eu comprimento beltrana!” Por favor, Dilma, por favor,
raciocine, acalme-se, comprimento é
tamanho e cumprimento é a ação de
cumprimentar, de saudar.
* * *
Erro na capa da revista Veja: “O real derrete” (12-10-2015). Como a nossa moeda vira
líquido, segundo a revista, o correto é assim: “O real se derrete.” Aceitando
“o real derrete”, então devemos passar a acreditar que o dinheiro da pátria do
“honestíssimo” Eduardo Cunha derrete o gelo ou o chumbo. Eis o exato, o
perfeito uso do verbo derreter, na
sua forma pronominal: “Ordenou Deus com tão grande milagre, que o maná, que não
se derretia ao fogo, se derreteu ao primeiro raio do sol” (padre Antônio
Vieira. Sermões, V, 147).
* * *
Erro do colega André Miranda, numa reportagem
sobre inéditos de Machado de Assis: este é o fundador da Academia Brasileira de
Letras (O Globo, 15-10-2015). Não,
quem fundou a ABL foi o jornalista Lúcio de Mendonça, como provo no meu livro A Academia do fardão e da confusão.
Machado de Assis se tornou o primeiro presidente daquela casa inútil, ridícula,
cagona e tão estéril como o útero de uma velha mula. Cagona porque se cagava de
medo diante dos gorilas do golpe de 1964, pois nunca protestou, após esse golpe,
contra as torturas, os atos de arbítrio, a censura nazista imposta à imprensa,
aos livros, aos espetáculos teatrais.
* * *
Erro do mamífero roedor Eduardo Cunha no seu
Facebook, divulgado no mês de agosto de 2015: “É uma acusação grave e que certamente
terão outros desdobramentos.” Ai, ai,
ai, ai, Eduardo! O terão, vomitado
pela sua cachola, é abominável, monstruoso, teratológico! Pare! Aprenda, roedor
voraz, o correto é terá, terceira
pessoa do futuro imperfeito do indicativo do verbo ter. Entendeu?
* * *
Erro de Frei Beto nesta frase: “A lição
descabida de corporativismo é digna dos 40 ladrões de Ali Babá” (Folha de S.Paulo, 16-11-2015). Correção:
Ali Babá não chefiava uma quadrilha de 40 gatunos. Ele era um comerciante
honesto, como se vê no conto das Mil e
uma noites, e penetrou na gruta cheia de riquezas desses bandidos, quando
se achavam ausentes. Depois, sabendo da sua visita, os assaltantes quiseram matá-lo,
porém a esperta escrava Morgiana, de Ali Babá, conseguiu tirar-lhes a vida, ao
derramar azeite fervente nas barricas onde se esconderam.
* * *
No “Programa do Jô” (11-12-2015), o Boni (José
Bonifácio de Oliveira Sobrinho), ex-diretor geral da Rede Globo de Televisão,
falou sobre o seu livro Dialogando com os
mortos e expeliu esta frase do
tamanho de um cocô redondo, soberbo, magnífico: “Por favor, não morre mais
ninguém” Boni, pare de defecar nauseabundos cagalhões, iguais aos dos elefantes
e dos dinossauros! Aprenda, Boni, aprenda, como a frase é um pedido, eis o uso
correto: “Por favor, que não morra
mais ninguém”!
* * *
O Correio
Popular de Campinas, na sua edição de 19-12-2015, apresentou uma reportagem
sobre a cantora francesa Édith Piaf,
comparando-a a um “pequeno passarinho”. Ora, o substantivo passarinho, conforme
o Dicionário da língua portuguesa, do
Cândido de Figueiredo, significa “pequeno pássaro”. Daí se deduz que dizer
“pequeno passarinho” é um excesso, uma redundância, como se vê nestas essas
três expressões: “sorriso nos lábios”, “viúva do falecido” e “exclusividade
total”.
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