Num dos meus encontros, em 1975, com
Juscelino Kubitschek no Banco Denasa, do qual
ele era presidente do Conselho de Administração (o
banco era dos seus genros), Juscelino me contou que teve uma crise de choro
em Belo Horizonte
no Palácio da Liberdade, quando o doutor João Pinheiro
Neto, seu oficial de gabinete (Juscelino era o governador de Minas),
começou a lhe dar informações, na manhã do dia 24 de
agosto de 1954, sobre o suicídio de Getúlio
Vargas. Eu ousei dizer ao
criador de Brasília, naquela ocasião:
-Presidente, além
das suas lágrimas derramadas pela morte do Getúlio, eu sei
que o senhor teve outra crise de choro.
Surpreso, abrindo mais
os olhos, ele pediu:
-Então me conte como eu tive
esta outra crise. Quero ver se você é um escritor
muito bem informado.
Comecei a narrar:
-No mês de junho de 1964,
devido a uma iniciativa do general Costa
e Silva, o seu mandato de senador foi cassado. E os militares,
estimulados pelo Costa, também suspenderam os direitos
políticos do senhor por dez anos. Não
é verdade?
Juscelino concordou:
- Pura verdade. E confesso, decidi sair
do Brasil por causa disso. Viajei para a Europa no dia 14
de junho de 1964. Mas prossiga.
Os olhos do ex-presidente, que às vezes
forneciam a impressão de ser de um chinês, revelavam uma viva
curiosidade. Eu continuei:
-Centenas de pessoas o acompanharam na
sua despedida. Um grupo de homens ergueu o senhor no
ar e o carregou sob palmas, aclamações, até
a escada do avião. Repito, eram centenas de pessoas que gritavam “vivas”, e o
senhor, emocionado, agitava um lenço branco.
Juscelino confirmou:
-É verdade, eu me
emocionei, senti o amor de povo, o seu
carinho por mim.
-Dentro do avião -
prossegui - o senhor não pôde
mais se controlar e caiu num choro
forte. Levou o seu lenço branco ao
rosto e o encharcou com as suas lágrimas.
Cheio
de espanto, Juscelino Kubitschek admitiu:
-Também é verdade, mas como veio a saber
desses fatos?
-Presidente, quem me contou esses fatos
foi o meu amigo Silveira Bueno, catedrático de filologia
portuguesa da Universidade de São Paulo. Ele já se
encontrava naquele avião, quando o senhor entrou. Viu o seu embarque, de uma
das janelas do aparelho, e o seu choro, pela fresta de
uma cortina grossa. O lugar em que o senhor se acomodou era isolado, no fundo
do avião, mas o professor Silveira Bueno estava sentado junto da cortina...
O ex-presidente fez o seguinte
comentário:
- Se você escrever a minha biografia,
decerto evocará este episódio. Chorei muito, lá dentro do avião, porque eu vi,
ao embarcar para o exílio, como o povo brasileiro me amava.
E Juscelino também não impediu o jorro
das lágrimas em outra ocasião, pois no ano de 1973, graças a
iniciativa do empresário João Abujamra,o Clube Nacional da
capital paulista o homenageou com um almoço.
Vários oradores
enalteceram o estadista nascido na cidade mineira de Diamantina.
Mas ao ouvir o discurso do meu pai, o grande orador Salomão Jorge,
que descreveu a sua infância de menino pobre, descalço, filho
de uma heróica e modesta professora, Juscelino chorou
copiosamente. Ali, naquele momento, todos puderam ouvir até
os seus soluços. João Abujamra, leal amigo do “Peixe
Vivo", é testemunha desse
fato.
Um
pensamento de Franz Grillpazer (1791-1872), poeta e dramaturgo alemão:
“As lágrimas são o
sagrado direito da dor.”
(“Die Thränen sind dês Schmerzes helig Recht!”)
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