quinta-feira, 19 de maio de 2011

O sonho é a nossa alma que sai do corpo

Sim, acredito, o sonho é a nossa alma que sai do corpo. Embora católico, possuo forte mediunidade e não alimento a menor dúvida: nós, seres humanos, somos espíritos materializados. Chico Xavier, nas páginas 443 e 503 do seu livro Parnaso de além túmulo (10ª edição), referiu-se a essa minha mediunidade.
Quando sonho com pessoas afastadas de mim há longo tempo, elas já faleceram, sem antes eu ter sabido disso. No sonho a pessoa conversa comigo. Sinto, nesses encontros realizados num outro plano, uma sensação absoluta de felicidade. Extravaso ternura, amor, carinho. Ao acordar fico tão emocionado que choro. Podem me chamar de “anormal”, se quiserem...
Conheci, no meu tempo de adolescente, uma jovem nascida nos Estados Unidos. Era bem bonita e tinha quatorze anos. Havia sofrido um tombo, num dia de chuva, na calçada em frente do portão de entrada da Graded School, escola americana do bairro do Paraíso. Eu a socorri e levei-a a uma farmácia, pois o seu joelho sangrava sem parar. Após o curativo, acompanhei a menina até a sua casa.
Mostrou-se gratíssima. Se me via, pegava a minha mão para puxar conversa. Ela mal sabia se expressar em português e eu nem entendia direito o seu inglês, mas percebi que a linda menina americana ficou gostando de mim, um garoto magrinho, feio, desprovido de qualquer atrativo físico. Uma tarde, sentados num banco do grande jardim da escola, ela apertou a minha mão e disse:
-Querro ser seu namorrada.
Arregalei os olhos, surpreso. Ela repetiu:
-Seu namorrada.
Respondi, sem jeito:
-Mary, é melhor sermos apenas amigos, friends.
Quis saber porquê e expliquei:
-Você é americana e eu sou brasileiro. Somos muitos diferentes.
A resposta foi imediata:
-Love is blind (o amor é cego).
Eu tentei argumentar:
-Você é loura, anglo-saxônica, e sou um brasileiro descendente de árabes, de beduínos. Os seus pais não gostariam de vê-la namorar um fulano como eu...
Depois frisei que a família dela era de ascendência nobre, britânica. Ela, perto de mim, parecia uma princesa e eu um plebeu... Mary ouviu e pronunciou estas palavras:
-The course of true love never did run smooth.
Não entendi. Rindo, ela escreveu a frase num papel e com esforço procurou traduzi-la para o português. Guardo até hoje a tradução nesse papel:
O caminho do amor verdadeiro nunca foi fácil.
Esta frase, a rigor, é do personagem Lisandro no primeiro ato da peça A midsummer night’s dream (“Sonho de uma noite de verão”), de William Shakespeare.
As colegas americanas de Mary, sempre que a viam ao meu lado, soltavam risadas e lhe diziam, mas não na minha frente:
-O que você viu neste brasileiro feio, raquítico, magrinho? Está louca? Trocou a beleza pela feiúra, o Scott por esse tal Ferrnandoss?
Scott era um belo, alto e musculoso rapaz americano, jogador de basktball. As jovens gringas da Graded School achavam que ele se parecia com o Clark Gable, o sedutor astro do filme Gone with the wind (“E o vento levou”). Mary, como resposta, citava este velho provérbio:
Beauty is in the eye the beholder.
(“Quem o feio ama, bonito lhe parece”).
Não sei se fui de fato namorado completo da mocinha da pátria do presidente Truman ou apenas seu amigo. Jamais procurei beijá-la, mas ela me dava beijinhos no rosto, acariciando as minhas mãos. Sentia-me algo ridículo, meio atrapalhado. Talvez eu fosse vítima de um complexo esmagador, pois os brasileiros, naquela época, julgavam-se inferiores aos norte-americanos. Aliás, hoje milhões dos meus patrícios ainda se consideram uma sub-raça diante deles ou então se tornam seus imitadores, brazilian monkeys, macacos brasileiros...
Um dia, após dois anos de namoro singelo, no decorrer do qual eu lhe punha balinhas de caramelo na boca, Mary me disse com o rosto cheio de lágrimas:
-Ferrnadoss, eu voltar United States! Eu voltar!
As suas lágrimas quentes rolavam. Emocionei-me. Só nesse momento percebi que o meu afeto por ela ia além da amizade.
Mary regressou aos Estados Unidos. Nunca mais soube do seu destino, embora ela houvesse prometido que me enviaria cartas. Não as mandou. Há duas semanas, porém, a minha namoradinha americana me apareceu num sonho. Ria e beijava-me. Estava muito feliz. Eu também me sentia muito feliz ao seu lado. No sonho beijei-a pela primeira vez e experimentei uma sensação de imensa felicidade.
Acordei chorando, com a impressão de tudo ter sido real, e disse a mim mesmo:
-Não a vejo há mais de quarenta anos. Ela morreu, sinto isto. A minha alma se encontrou com a sua alma.
Ontem, uma ex-colega de Mary na Graded School me reconheceu. Perguntei:
-E a Mary?
A ex-colega me contou que ela, logo depois de voltar para os Estados Unidos, foi vítima de um acidente automobilístico e ficou numa cadeira de rodas, sem poder falar e movimentar as pernas, os braços, as mãos. E concluiu:
-Mary morreu há duas semanas.
Invadiu-me uma tristeza indescritível. Pensei: a minha alma, e a alma da mocinha americana que me amou, encontraram-se numa outra dimensão, graças a um sonho. Estiveram bem juntas, a fim de aliviar as saudades que eu sentia dela e ela sentia de mim...

2 comentários:

Leonardo disse...

vez enquando eu tenho isso,e fico asustado quando aconteçe.Penso que vou morrer

alex disse...

tb aconteceu comigo ai e fk supreso de maias......