Leitora assídua da coluna de Ricardo Noblat, do jornal “O Globo”, a professora carioca Ana Rocha Moreira não se conforma com as críticas que ele vem sofrendo no referido matutino, por parte de uma equipe chefiada pelo Aluizio Maranhão. Leiam um trecho da carta de Ana, enviada a mim:
“Aluizio Maranhão condenou o Noblat, da sucursal de Brasília, porque ele disse no texto ‘Boa sorte, Obama!’, publicado na edição do dia 10 de novembro de 2008 de ‘O Globo’, que ‘Lula desfruta de uma popularidade de que presidente algum desfrutou”. Sublinhei o ‘desfruta de’. No entender do Aluizio e do seu grupo, a frase do Ricardo contém um vistoso erro de português, pois o verbo desfrutar, alegam eles, ‘não pede preposição’. Para o grupo o correto é assim: “desfruta uma popularidade”. Ora, volta e meia eu vejo em livros, jornais e revistas, à farta, este verbo com a preposição de. É uma regência aceita no Brasil, há dezenas de anos. Nas questões de linguagem, o uso, em casos dessa natureza, faz a regra. Concorda?”
Eu concordo professora. Basta dizer que no verbete desfrutar, inserido na página 484 do “Dicionário de usos do português do Brasil”, coordenado pelo professor Francisco S. Borba (Editora Ática, São Paulo, 2002), foram registradas estas três construções:
“...o passarinho de minha história desfruta de liberdade ampla e irrestrita.”
“O Brasil desfrutou de condições muito favoráveis.”
“O Sr. Gabriel Bernardes desfrutou de elevado conceito.”
A primeira frase é do jornal “O Popular”, de Goiânia; a segunda é do livro “Os servos da morte”, de Adonias Filho, lançado em 1965; e a terceira é do diário “Correio do Povo”, de Porto Alegre. Exemplos eloqüentes de uma regência adotada por jornais sérios e um escritor culto. Não se justifica, portanto, a crítica do Aluizio Maranhão e da sua equipe ao texto do Ricardo Noblat. Ele, Aluizio, e a tal equipe, precisam atualizar-se e deixar de agir como cegos fiscais da língua portuguesa.
Todavia, a história não acaba aqui. Mereceu mais uma censura da professora Ana Rocha Moreira a crítica irracional do Aluizio e do seu grupo a um outro texto do Ricardo Noblat, intitulado “Como jabuticaba”, aparecido na edição do dia 17 de novembro de 2008 de “O Globo”. Procedendo como um Hitler, como os ditadores do III Reich da Gramaticolândia, eles reprovaram fascistamente, nazistamente, esta construção do Noblat:
“...5% da receita do município servem para pagar os vereadores...”
Correção do Aluizio e da sua turma:
“...servem para pagar aos vereadores”...
Aluizio e o seus cupinchas não evoluíram, só aceitam, com o verbo pagar, o objeto indireto de pessoa. Esconjuram a sintaxe pagar alguém. Ora, Antonio de Moraes e Silva, no clássico “Diccionario da lingua portugueza”, cuja primeira edição é de 1813, já havia apoiado esta regência ao dar quatro exemplos:
I – Pagar as tropas.
II – Pagar os criados.
III – Pagar os trabalhadores.
IV – Pagar as dívidas.
Como observou Antenor Nascentes no livro “O problema da regência”, a primitiva transitoriedade direta do verbo pagar é que permitiu, ao nosso idioma, transformá-lo num transitivo direto, com objeto de pessoa.
Concluindo: a crítica do Aluizio Maranhão e de seus auxiliares aos textos do Ricardo Noblat não foi só injusta. Foi antes de tudo desastrosa e trouxe à nossa memória estas palavras do moralista francês Vauvenargues (1715-1747), colocadas nas “Réflexions et Maximes”:
“O erro é a noite dos espíritos e a armadilha da inocência”.
(“L’erreur est la nuit des esprits et le piège de l’innocence”).
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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do romance satírico “O grande líder”, cuja 5ª edição foi lançada pela Geração Editorial.
Um comentário:
Prezado Sr. Fernando Jorge,
Apenas uma pergunta sobre seu passado. O Sr. estudou, no clássico, no colégio Carlos Gomes, em São Paulo? Se este foi o caso, deve ter sido colega de meu pai, Itic Roizman. Juntos escreveram o jornalzinho o Guarani? Seria o senhor?
Se quiser responder, escreva-me para maysablay@yahoo.com.br
Cordiais abraços,
Maysa Blay Roizman
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