domingo, 31 de março de 2019

O AUXÍLIO-CUECA


A Justiça determinou: a Assembleia Legislativa de São Paulo está impedida de pagar o auxílio-paletó, correspondente a 40 mil reais em duas parcelas, aos 94 nobres representantes do povo da terra de Rodrigues Alves.
Eu chamava esse auxílio (por achar mais apropriado), de auxílio-cueca. Era um salário-extra, pago no começo e no término de cada ano, a todos os senhores deputados do Legislativo paulista (o qual se caracteriza pela imensa austeridade), poderem comprar roupas novas, camisas, gravatas, paletós, calças, meias, e principalmente, acredito, lindas e cheirosas cuecas de seda, de cor marrom (da cor das fezes), ou azul, ou vermelha, ou cor-de-rosa gay, ou verdes-e-amarelas, como prova indiscutível de berrante patriotismo, de demagógoca paixão pelo Brasil...
Em sentença de oito páginas, o meritíssimo juiz Luís Fernando Camargo de Barros Vidal, da 3ª Vara da Fazenda Pública da capital paulista, acolheu a ação civil do Ministério Público Estadual e impôs, ao Poder Legislativo, o corte da verba que é denominada “ajuda de custo”, também conhecida como “verba de enxoval”.
A ação para eliminar o auxílio-cueca tornou-se uma iniciativa, em 2011, dos promotores Saad Mazloum e Sílvio Antônio Marques, membros da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, braço do Ministério Público cujo escopo é realizar investigações sobre atos de desmandos, de corrupção, de improbidade administrativa.
O auxílio-cueca foi previsto no artigo 1º da Lei 11.328, de 2002, e no artigo 88 do Regimento Interno da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, mas os promotores Saad e Sílvio, na ação, mostraram a inconstitucionalidade da vantagem instituída. Além de violar o artigo 18 da Constituição do Estado, no entender de ambos, o auxílio-cueca “feria de morte a moralidade”.
Após esse “humanitário” auxílio ter sido suspenso, o deputado Barros Munhoz, do PSDB, presidente da Assembleia, declarou de modo firme, sob o domínio de uma raiva mal disfarçada:
“Não enxergo problemas no benefício. Existem coisas muito mais imorais em outras instituições do nosso país. O auxílio é legal, é claro, é transparente, sem nada de errado”.
Sua excelência se expressou de forma infeliz, porque salientou que há coisas mais imorais em nossa pátria. Ora, então eu pergunto: o auxílio-cueca, por ser “menos imoral”, deixa de ser imoral?
Juro, amigo leitor, eu compreendo a oculta indignação do deputado Barros Munhoz. E sinto enorme pena dos seus 93 colegas da Assembleia Legislativa de São Paulo, pois cada um deles, pobrezinhos, só conta, todos os meses, com o auxílio moradia de 2.250 reais; com o curto salário de 20 mil reais; com os ridículos 23 mil reais para certos gastos, como Correios, gasolina e compra de jornais; com a miséria de apenas 94 mil reais mensais, destinados à verba de gabinete, ao pagamento dos pouquíssimos 32 assessores de cada um...
Vejam agora os milhões e milhões de reais que os 94 parlamentares de São Paulo custam aos cofres públicos. Só o auxílio-cueca custava, todos os anos, mais de 3 milhões de reais a esses cofres.
Reprovo a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo por ter decidido não recorrer da sentença judicial que acabou com o poético auxílio. Tal medida, tomada pela Mesa Diretora, teve o respaldo unânime dos líderes de todos partidos.
Deputado Barros Munhoz e demais parlamentares, eu sustento: os senhores foram duros, insensíveis, maus, pelo fato de não contestarem o fim do abnegado auxílio-cueca, pois causaram uma grande mágoa às perfumadas cuecas paulistas de seda. As coitadinhas estão infelizes, pesarosas, chorando. Elas sentiam tanto orgulho em resguardar as vossas bem nutridas bundas! Quem as consolará, quem? O Paulo Salim Maluf? O prefeito João Izael, de Itabira, que sofre de bibliofobia aguda?

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