Mauro
Felippe, desde a sua adolescência, sempre amou a cultura, os livros, pois como
Richard de Bury (1281-1345), bispo de Durham, condado da Inglaterra, ele sabia
que “o amor aos livros é amor à sabedoria”, conforme escreveu em latim esse
religioso, no capítulo XV da obra intitulada “Philobiblion”: amorem librorum, amore sapientiae constat
esse.
A
paixão de Mauro pela literatura e pelos expoentes desta, levou-o a retratar
Cervantes e o Quixote numa poesia. Definiu assim o fidalgo manchego: “um gênio
abstrato, atemporal”.
Na
poesia de Mauro Felippe os espelhos vivem, estremecem, palpitam, latejam como
as artérias, expressam sentimentos sutis, transmitem mensagens das profundezas
da alma. O argentino Jorge Luís Borges, cujo tema chave dos seus textos é o
eterno retorno, consubstanciado em símbolos e imagens, aplaudiria, cheio de
entusiasmo, a composição “Reflexos”, de Mauro Felippe, produzida no mês de maio
de 2016:
“Os espelhos do mundo,
Sempre estão cheios de pessoas às suas frentes
Vêm, automaticamente, aos seus encontros,
Para ver e matar as saudades latentes.
Sentem a falta dos que se viram
E se vão, não voltam mais.
De tristeza, oxidam-se e escurecem,
Fixados nas velhas paredes que não os deixam cair jamais.
Quantas rugas avistaram, enquanto emoldurados,
Quantos corpos nus adiante – abstinentes,
Flagelos do tempo que, quando embaçados,
Refletem aos ventos os seres indecentes.
Os espelhos do mundo
Refletem menos os homens do que os seus adornos,
Sempre nos momentos que os desejarem,
Sempre para reinventarem seus egos, antes dos próximos
retornos.”
Castro
Alves, no soneto “Bárbora”, colocou estes versos:
“Um dorso
de Valquíria... alvo de bruma,
Pequenos
pés sob infantis artelhos,
Olhos
vivos, tão vivos como espelhos,
Mas como
eles sem chama alguma;”
Para
Mauro Felippe, no entanto, os espelhos tem labaredas, pois os vê como seres
reais. E acha, suponho, que eles podem sentir saudades das pessoas mortas.
O
mineiro Basílio da Gama (1741-1795), é autor destes versos, inseridos na poesia
“A declamação trágica”:
“Do vidro
que te engana, não sigas o conselho:
busca,
que dentro d’alma tens o melhor espelho”
Mas,
a rigor, na visão de Mauro Felippe, os espelhos também possuem alma e não são
apenas, num vidro, os reflexos dos corpos materiais.
O
verdadeiro poeta é capaz de ver a beleza até nas coisas que, de imediato, nos
parecem feias ou imundas. Eis a prova da nossa afirmativa, nos seguintes versos
de “A poça”, escritos por Mauro em julho de 2015:
“Na lama
inerte,
Intacta –
assentada,
Exposta
ao céu,...
Uma poça.
Poça de
água parada,
Sobre a
terra – sobre o barro,
Feita
pela chuva,
Que
sempre a transborda e após recua.
Na lama –
aquela poça
Cristalina
e crua,
Sobre o
humus barrento
Que no
seu reflexo se vê a lua.
E
até numa flor de plástico o hipersensível Mauro Felippe contemplou a beleza.
Admirem estes seus versos, nascidos nas vésperas do Natal de 2015:
“Era
apenas uma flor de plástico,
Como
àquelas encontradas aos milhares.
Barata –
artificial,
Composta
de pétalas cheias de pó.
Quem
poderia imaginar,
Ela
replicada em todos os cantos,
Nos
claros e nos escuros recantos,
Nas mesas
e sobre as lápides, no pó.
Ela pensa
em nós,
Mesmo
sendo de plástico,
Apenas
uma flor,
Colorida,
com pó.
Ornamenta
vasos e corações,
Como as
reais,
Não
murcha, só desbota.
Mas basta
perder uma pétala, que no lixo vira pó.”
Deduzimos,
portanto, de maneira absolutamente lógica: Mauro Felippe é um poeta filósofo,
como foram Augusto dos Anjos e Raul de Leoni em nossa literatura. Na sua poesia
o pensamento se harmoniza com o sentimento. Ambos não se chocam. Versos de sua
lavra, e cito aqui o poemeto “Assobia o canto triste”, revelam isto e provam
como filosofar, frequentes vezes, é também dulcificar a realidade. Shakespeare
não errou ao escrever estas palavras na cena quinta do ato terceiro da peça Romeu e Julieta:
“Filosofia, doce leite da adversidade!”
(Adversity’s
sweet milk, philosophy!”)
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