domingo, 8 de março de 2020

A PÁTRIA DE CABEÇA PELADA

Quem viaja, por estrada de rodagem, de São Paulo a Belo Horizonte, ou do Rio de Janeiro a São Paulo, ou através de outras estradas do Brasil, fica impressionado com a desolação da paisagem. É difícil aparecer, em toda a extensão do percurso, qualquer grupo compacto de árvores. De vez em quando nos campos nus, nos montes escalavrados, nas melancó­licas planuras onde medra uma pobríssima vegetação rasteira, surge o vulto triste e altivo de uma árvore solitária. É como uma pincelada escura num quadro cor-de-ocre.
Em 1938, no Rio Grande do Sul, existiam 9 milhões e 800 mil hecta­res de florestas, isto é, 34,47% da área do estado. Agora restam apenas 2 milhões e meio de hectares, o que corresponde a cerca de 7 % da área total do território gaúcho. Na região centro-oeste desse território – observa Fernando Guedes - "o verde dos campos está dando lugar a enormes manchas desérticas e totalmente estéreis", cujo crescimento chega a atingir quase 20% ao ano. E tal fenômeno acontece a pouco mais de quatro­centos quilômetros de distância de Porto Alegre, na faixa de solo arenoso em que estão localizadas as cidades de Alegrete e São Francisco de Assis.
No Século XVI era copiosa, superabundante, a cobertura vegetal do Nordeste brasileiro, mas depois o Ciclo do Gado arrasou-a.
Segundo um estudo concluído pelo Instituto Agronô­mico de Campinas e pelo Instituto Florestal do Estado de São Paulo, se continuar a devastação das matas paulistas, a área que elas cobrirão dentro de 25 anos será de apenas 2 ou 3 por cento. São Paulo, deste modo, transformar-se-á num imenso deserto. Atualmente, pouco mais de 8 % da superfície do estado - o que equivale a uns 20 mil quilômetros qua­drados - ainda apresenta cobertura de floresta primitiva. Resultado: já se observa, em muitas bacias hidrográficas uma sensível alteração dos mananciais de águas. E não só isto: começam a surgir mudanças climáticas e verifica-se uma acentuada diminuição da fertilidade do solo.­
As estatísticas a Unesco informam que Brasil, quinto país o mundo em extensão territorial, ocupa numa lista de 70 nações o obscuro 28º lugar em área reservada a parques nacionais, e o vergonhoso 62º em porcentagem da área em relação ao tamanho completo do país.
O barão do Rio Branco presenteou-nos com mais terras, dilatou a extensão territorial do Brasil. Mas é preciso zelar por este patrimônio, conservá-Io, torná-lo habitável, respiráveI. Um país sem árvores é um deserto, é uma nação sem beleza, sem oxigênio.
Em 1908 os Estados Unidos chegaram a uma conclusão dramá­tica: se não fosse adotada nenhuma providência destinada a preservar as reservas florestais existentes no país, além de se proceder a um refloresta­mento nos terrenos devastados, a pátria de Lincoln não teria madeira para o seu consumo nos próximos sessenta anos. Diante de tão grave alternativa, o Congresso norte-americano elaborou leis e aprovou um conjunto de me­didas que impediram a marcha daquele vandalismo...
O Brasil de 2006, quanto ao problema da devastação florestal, apro­xima-se da mesma situação dos Estados Unidos de 1908.
Precisamos com urgência de um presidente que seja patriota e não demagogo, capaz de ser o líder de uma vitoriosa Campanha Nacional de Reflorestamento, pois o Brasil de hoje, carecido de árvores, de vegetação, é um país careca.
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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.

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