Diogo Mainardi, na sua coluna da revista “Veja” (edição de
15-12-2004), garantiu que os paulistas, na Revolução Constitucionalista de
1932, agiram como fujões, como covardes. Não sou paulista, mas fiquei indignado
ao ler esta infâmia do Mainardi. Ele, para mim, é um profissional da calúnia,
do insulto louco e nojento.
São Paulo, em 1932, porfiou bravamente, a epopeia que
esculpiu, nas páginas da nossa História, é imperecível, é tão soberba como a do
grego Leônidas e dos seus trezentos espartanos no desfiladeiro das Termópilas,
as “Portas Quentes” onde esses heróis tentaram deter o imenso exército de
Xerxes, o opulento e enfatuado soberano persa.
Pode-se afirmar:
São Paulo jamais vacilou ou esmoreceu na luta travada contra a Ditadura. Daí o
motivo de não aceitarmos este julgamento de Afonso de Carvalho, no seu livro
“Capacetes de Aço”:
“Mais tarde, quando a técnica militar fizer o estudo sereno
e imparcial
da Revolução Paulista, há de reconhecer, por certo, que o erro principal de São
Paulo, com imediato e decisivo fracasso nas operações militares, foi este:
esperar. São Paulo ficou todo o tempo esperando por alguma coisa, na antevisão
de um messianismo redentor. Espera pelo Rio Grande - e o general Waldomiro Lima atravessa
Itararé e parte fundo até Buri. Espera por Minas - e as tropas da 4ª DI tomam Guaxupé, Casa
Branca, São José do Rio Pardo e, prestes, batem às portas de Campinas. Espera
por um novo golpe pacificador na capital da República. Espera pelo sr. Artur
Bernardes. Espera pelo sr. Borges de Medeiros. Espera pelos navios que devem trazer
armamento da Europa. Espera pelos aviões, que devem vir da Argentina e do
Chile. Espera pelo Anti-Cristo. Nunca se esperou tanto no Brasil!”
Estas palavras são injustas. O erro
fundamental dos paulistas foi o de não terem, logo no início, avançado em
direção ao Rio de Janeiro, pois a investida dos rebeldes, na frente Norte,
seria decisiva para alcançar a vitória. É verdade que os constitucionalistas
aguardavam o apoio de Minas Gerais, de Mato Grosso e do Rio de Janeiro, sem
falar das adesões de outros estados. Mas depois que as esperanças se
desvaneceram, e isto não tardou a acontecer, São Paulo lutou com ardor e
tenacidade. Fez um esforço prodigioso, admirável sob qualquer aspecto: fabricou
bombas, morteiros, canhões pesados, granadas de mão, lança-chamas, máscaras
contra gases, diversas espécies de armas e munições. Todo o povo se ergueu,
num magnífico gesto de desassombro: velhos, jovens, mulheres, crianças,
operários, industriais, damas da alta sociedade. São Paulo movimentou-se,
pelejou. A sua mocidade, ardente e idealista, sacrificou-se em Cunha,
Cachoeira, Túnel, Mogi, Eleutério, Lorena, Silveiras, Rio das Almas, no Vale do
Paraíba, nos ásperos grotões e contrafortes da Mantiqueira. São Paulo não
esperou, agiu. São Paulo não se conservou imóvel como um faquir, mas viril,
másculo, dinâmico, esplêndido, resoluto, à semelhança daqueles guerreiros
gauleses que, embora de modo desvantajoso, enfrentaram as invictas e compactas
legiões romanas.
Ao São Paulo de 1932, ao São Paulo da
Revolução Constitucionalista, aplica-se aquelas palavras que Rui Barbosa
proferiu em 1919, quando respondeu às observações de um jornalista de “O imparcial”:
-
“Porque
não se luta só para vencer, luta-se também para perder. E, às vezes, é
mais nobre perder que vencer.”
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Escritor e
jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio
de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.
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