
Sejamos justos, os nossos políticos também
não param de soltar besteiras, de cometer atentados contra a língua portuguesa.
Errar, neste sentido, não é um privilégio dos estudantes da 4ª série. Informou
a jornalista Hildegard Angel, por exemplo, que o prefeito de Araruama, ao
candidatar-se à reeleição, tinha o costume de dizer nos comícios:
"Quero reganhar! Meu povo e minha
pova, com a minha fé e a fé de vocês, vamos juntar as nossas fezes!”
Esse prefeito é um gênio da língua
portuguesa, pois inventou o verbo reganhar, o substantivo feminino pova
e o plural fezes, aliás bem fedorento.
O episódio que agora vou descrever mereceu
até uma notícia na primeira página do matutino O Globo.
Na câmara municipal de uma cidade do
interior de São Paulo, certo vereador pronunciou no meio do seu discurso o
adjetivo óbvio, o qual serve para designar a coisa muito visível, clara,
manifesta, patente. Um segundo vereador o aparteou:
-Perdão, nobre colega, a pronúncia correta
é obvio, sem acento no primeiro o.
Aí um terceiro vereador reagiu:
-Discordo! A pronúncia correta é óbvio,
com acento no primeiro o.
-Não, é obvio, sem acento! -
ornejou um quarto vereador.
Estabeleceu-se o bate-boca, o tumulto.
Todos os vereadores entraram no debate.
-A pronúncia correta é obvio - zurrava um.
-Não, não, em absoluto, é óbvio com
acento.
-Protesto, é obvio sem acento -
relinchava outro, talvez querendo comer capim e com as ferraduras frouxas nas
quatro patas.
Sua excelência, o presidente da câmara
municipal, a fim de solucionar o gravibundo problema, colocou o assunto em
votação. Resultado: os defensores da pronúncia obvio, sem acento no
primeiro o, saíram ganhando de maneira esmagadora.
Altamente inspirado, eu compus este
poeminha:
Óbvio ou obvio?
Berravam num rodopio,
repletos de maus odores,
de furores,
os senhores vereadores.
E a maioria,
com ares de muares,
cérebro vazio,
a pular como macacos no cio,
gritava “obvio”!
Caiam as suas frouxas ferraduras,
roncavam os seus estômagos sem capim,
perdiam as composturas,
até pareciam os bêbados de um botequim!
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Escritor e
jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio
de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.
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