O professor Silveira Bueno, catedrático de Filologia
Portuguesa da USP, autor de um monumental dicionário etimológico – prosódico do
nosso idioma, sempre me dizia que o melhor método de aprender o português é o de corrigir
as frases erradas da língua de Machado de Assis. Tenho adotado até hoje o seu método.
Certa vez esse mestre me aconselhou:
-Fernando,
não queira agradar a ninguém. Seja absolutamente sincero aponte o erro, mas
evite a crítica de natureza pessoal.
Eu
adorava a franqueza do professor Silveira Bueno, de quem fui aluno e amigo
íntimo. Certa vez ele concedeu uma entrevista ao Caderno 2, de “O Estado de S.
Paulo”. E assim comentou os numerosos erros gramaticais de um ilustre e conhecidíssimo membro da
Academia Brasileira de Letras:
“Este senhor precisa voltar à escola.”
A equipe de
redatores “O Globo” é excelente, uma das melhores do nosso país. Sou um leitor
assíduo desse matutino, que para mim é o mais bem feito do Brasil, por ser
eclético, moderno, bonito sob todos os aspectos.
Pelo
fato de seguir o conselho do meu mestre Silveira Bueno, e ainda devido a minha
repulsa pelas críticas injustas, aplicadas por Luiz Garcia, ombudsman de “O Globo”,
a uma de suas colegas, eu passo agora a defendê-la, a provar como ela não errou. Mas
enfatizo, a
nossa crítica não tem
nenhum caráter pessoal. Só o amor à verdade me impele. O mesmo amor que levou
São Bernardo (1091-1153), um dos maiores vultos do Cristianismo, fundador da
Abadia de Clairvaux, a afirmar o seguinte na obra Saper Matthaeum:
“Não
é só traidor da verdade quem diz o falso em vez do verdadeiro, mas também quem
não diz independentemente a verdade que deve ser proclamada, ou não defende independentemente a verdade que necessita de defesa.”
(“Non solum
proditor estveritatis, qui mendacium pro veritate loquitur, sed qui nolibere
pronuntiat veritatem, quam pronuntiare oportet: aut libere defendit veritatem,
quam defendere oportet”)
Apoiando-me,
portanto, no mestre Silveira Bueno, em São Bernardo e no meu amor à verdade, declaro que o ombudsman Luiz Garcia
errou
de modo feio ao criticar a sua colega Heliana Frazão, da sucursal de Salvador,
por ela ter empregado a palavra cassável na reportagem “Wagner lança
obra com cassável”, publicada na edição do dia 11 de janeiro de 2006 de “O Globo”. Garante o Luiz Garcia:
“Esta
palavra não existe” (“O Globo”, 12-1-2006, página 2).
Você
se precipitou, Luiz, a palavra cassável existe, e já está dicionarizada.
Leia este verbete da página 294 do ótimo “Dicionário de usos do português do Brasil”, cujo autor é o professor
Francisco S. Borba, obra lançada pela Editora Ática em 2002:
“cassável adj
(Qualificador
de nome humano
abstrato)
1
passível de ser demitido de suas
funções; que pode ser cassado: Moreira está lista dos deputados
cassáveis de Brasília (VEJ). Na pessoa passível de ser demitida de suas funções: presidentes
da Câmara e do Senado enviam nomes cassáveis às respectivas comissões (VEJ); Cassável já teve defesa suficiente, diz Aristides (FSP)."
Antes
de criticar as suas de colegas de
“O Globo”,
senhor Luiz Garcia, não se
afobe, tome mais cuidado, e memorize este provérbio:
"Quem quer chegar muito depressa, arrisca-se a ficar manco”
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Escritor e
jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio
de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.
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