domingo, 8 de dezembro de 2019

VIVA A LIMPEZA, A HIGIENE!


Professor da Universidade de Munique, o arguto Justus von Liebig (1803-1873) descobriu o método de transformar o álcool em ácido acé­tico, de maneira instantânea. Esse notável químico alemão é o autor da seguinte frase:
“O progresso dos povos se pode avaliar pelo consumo de sabão.”
Liebig, a quem a Ciência também deve a descoberta da pre­paração artificial do ácido tartárico, achava que quanto mais uma pessoa usa a água para eliminar a sujeira do seu corpo, mais civilizada ela é. E fica mais sadia, acrescento, pois um velho provérbio garante:
“Água e sabão, fazem o homem são.”
Bourdeau informa, na “Histoire de L “ habillement et de la parure”: o rei Luis XIV, da França, só tomou um banho durante toda a sua vida. Aliás, vejam outro absurdo. Médico famoso da Idade Média, o doutor Gazius se atreveu confessar:
“...o uso dos banhos é um prazer, não destituído de perigo. Talvez seria melhor não falar sobre o medo de cheirar mal. Eu, que nun­ca tomei um banho, sinto-me muito bem, graças a Deus”
Insigne historiador, Michelet comenta, ao evocar aquela época:
"Nem um banho durante mil anos! A sociedade da Idade Mé­dia temia a ablução como um pecado e é triste pensar que todos esses esbeltos cavaleiros, todas essas damas etéreas, Tristão, Parsifal, Isolda, não se lavavam nunca!"
Os monges do Mosteiro dos Carmelitas, na cidade de Pádua, do norte da Itália, também não gostavam de tomar banho. Assim procediam para castigar a carne, vista por eles como a origem de todos os nos­sos males, de todas as nossas imperfeições. Sempre exalavam odores nausea­bundos e cumprimentá-los, pedir-lhes a benção, era torturar o olfato. Após visitar o referido mosteiro, um viajante declarou:
"Nunca pude compreender porque há homens que se reúnem para feder juntos, em honra de um Deus que criou noventa mil espécies de flores."
D. João VI, refugiado no Brasil, não tomava banho. As suas ceroulas caiam apodrecidas e ele metia nos seus bolsos engordura­dos, sem parar, as coxinhas de frango que mastigava com gula insaciável. Imaginem como esse homem fedia... Patrício do rei português, o doutor Baleisão era bem porco. Certa senhora ousou aludir, diante dele, à sua falta de higiene. Assumindo um ar grave, o doutor Baleisão respondeu:
-Pois, minha excelente senhora, de tomar banho tem morrido muita gente, e de porcaria nunca ninguém morreu!
Mas D. João VI, no tempo do Brasil-Reino, não foi o único que detestava a água. Rose de Freycinet (1794-1832), escritora francesa, visitou o nosso país nessa época e descreveu a imundice do Rio de Janei­ro, a qual atingia o auge entre os nobres:
“Uma dama nobre que acabava de tomar uma criada de quar­to francesa, quase a pôs fora de casa só porque esta lhe oferecia um vaso cheio de água para lavar as mãos. Em cólera, disse-lhe a mesma dama que uma pessoa de sua qualidade não tinha nunca necessidade de lavar as mãos, atendendo a que nada de sujo tocava, e que isso de lavar era bom para os cria­dos e o povo.”
Luiz Edmundo colocou estas palavras de Rose de Freycinet no seu livro “O Rio de Janeiro no tempo dos vice-reis”, publicado em 1932 pela Imprensa Nacional. A descrição de Rose mostra o horror à água daquelas pessoas. E se a frase de Liebig expressa a verdade – “O progresso dos povos se pode avaliar pelo consumo de sabão” - o brasileiro evoluiu extraordinariamente, quanto à higiene, pois ao contrário de milhares de europeus, adora tomar banho...

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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins.

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