Uma coisa que sempre me impressionou,
neste mundo, é ver a enorme
quantidade de pessoas que fazem questão de provar como são débeis mentais. Eu
as encontro em toda parte, nas ruas, nos bares, nos restaurantes, nos lugares
públicos. Logo identifico o cretino satisfeito com a sua própria
cretinice. Burros verdadeiros, e, portanto, incapazes de se corrigirem, de não se
mostrarem ridículos e importunos, eles aumentam a minha admiração por gatos,
girafas, cachorros, camelos e elefantes, pelas centenas de criaturas do reino
animal. Perto desses idiotas, qualquer quadrúpede me dá a impressão de ser um
Einstein, um Rui Barbosa.
Há pouco tempo fui almoçar num restaurante da rua Haddock Lobo,
com
várias
salas. Escolhi uma dessas salas e somente um casal se achava ali, a distância de oito metros da
minha mesa. Era um homem de meia idade e uma jovem bem bonita, de 18 ou 20 anos.
Comecei a ler o jornal
que
havia
trazido, enquanto o prato não vinha. Ouvi o homem maduro dizer, baixinho:
-Ele está
nos olhando?
A moça me
fitou, disfarçadamente, e respondeu:
-Não.
O homem franziu a testa, preocupado. De
fato, eu não estava olhando os dois, de modo direto, mas embora com os meus
olhos postos no jornal, podia vê-los, sem que percebessem. Aí o fulano soltou
as seguintes palavras:
-Querida,
como você é
linda!
Me dá um beijo forte, gostoso!
Falou
bem alto, para eu ouvir. Meio constrangida, a jovem o atendeu. Então o cretino
quis saber:
-Olhe de novo, veja se ele está nos
olhando.
Continuei
a ler o jornal, porém tenho a capacidade de ouvir e enxergar a certa distância,
com os olhos abaixados. O cretino, grudado na moça, voltou a perguntar:
-Ele está nos olhando?
Outra vez
a moça respondeu:
-Não.
De cara
fechada, irritado, o debilóide pediu:
-Me
dá mais um beijo forte, gostoso.
Algo envergonhada, ela o beijou de
leve na face, mas ele
reagiu:
-No rosto não, querida, quero um
beijo bem longo, forte e gostoso na minha boca! Um beijão!
Ao
pedir isto, o homem me fitou com o rabo do olho. Eu continuei a ler o jornal e
disse a mim mesmo: o cretino quer que eu o admire e sinta inveja dele, mas não
vou lhe dar este prazer!
Concentrei-me na leitura do jornal,
apesar do meu prato já ter chegado. Frenético, o exibicionista não sabia mais
como agir, a fim de chamar a atenção. Acariciava os cabelos da moça, o seu
rosto, beijava a sua boca, pedia para ela o beijar, sussurrava-lhe palavras
melosas no ouvido, sempre com o rabo do olho na direção da minha pessoa.
Firme, apesar de estar vendo tudo
isto com os meus olhos abaixados, continuei mergulhado na leitura do jornal.
Eles
já. haviam terminado a refeição e o sujeito teve de chamar o garçom. Pagou a
conta e ambos se levantaram. Ao passar perto de mim, o fulano me olhou com
ódio, com fúria, e graças a Deus foi embora. O garçom me disse, após eu lhe
contar o que aconteceu:
-Doutor, esse homem é um empresário
muito rico e a sua mania é
a de querer ser invejado pelos outros homens, pois pensa que é um grande conquistador de mulheres.
Respondi:
-Não, ele
não é
um grande conquistador de
mulheres. É apenas um grande cretino!
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Escritor e
jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio
de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins
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