Às 23 horas e 40 minutos do dia 30 de outubro de 2002, a estudante Suzane Louise von Richthofen, de dezenove
anos, e o seu namorado Daniel Cravinhos, com o irmão deste, Cristian Cravinhos, entram
na casa dos pais de Suzane, do engenheiro Manfred
von Richthofen e da sua mulher Marisia. Bem cautelosa, Suzane vai verificar se os
pais estão dormindo. Depois se afasta. Os dois irmãos,
no quarto do casal, arrebentam as cabeças de Manfred e de Marisia com barras de
ferro. Para simular um assalto, os assassinos espalham joias no quarto e
colocam um revólver perto da cadáver do engenheiro. Enquanto os dois irmãos
esmigalhavam as cabeças dos seus pais, Suzane desarrumava a biblioteca da casa,
a fim de também dar à polícia a impressão de ter sido um assalto.
Tranquilos, os três pegam o dinheiro e saem da residência. Sentindo-se plenamente
realizada, muito feliz, Suzane vai para um motel com o namorado. Que delícia,
saciar o apetite sexual, após saber que as cabeças do papai e da mamãe foram
esmigalhadas!
No enterro, a loura Suzane chora,
mas logo, três dias depois, ela promove a festa do seu aniversário, à beira da piscina da casa. É uma churrascada. Carnes ótimas, picanha
deliciosa, bebidas da melhor qualidade... Oh maravilha, Suzane ficou com a
mansão, o dinheiro dos pais e o seu querido Daniel! Poderia alcançar maior
felicidade?
A polícia elucida o crime. E
exibindo a sua carinha angelical, Suzane confessa que planejou tudo calmamente,
com dois meses de antecedência.
Motivo: os pais preconceituosos
se opunham ao seu romântico namoro, não aceitavam o meigo Daniel, rapaz pobre,
bonzinho, bonitinho.
Imaginemos o que
se passou na linda cabecinha da incompreendida Suzane. Papai e mamãe não
gostam do meu amado? Ah, então papai e mamãe não merecem viver! As suas cabeças
duras, estupidas, precisam ser arrebentadas com barras de ferro!
Estabelece a
Constituição Federal, no inciso LVII do Artigo
5º, referente aos direitos e deveres individuais e coletivos, que
“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória”. Portanto, segundo a Carta Magna, a presunção de inocência, antes do último julgamento, deve ser observada.
Por três votos a
dois, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu o habeas corpus a Suzane. Ela aguardará o seu julgamento fora da
Penitenciária de Rio Claro. Mas de acordo com o Artigo 312 do Código do
Processo Penal, há um requisito que baseado na garantia da ordem pública,
autoriza a prisão preventiva. Ora, o crime hediondo de Suzane fez dela uma
ameaça, um perigo para a segurança da sociedade. Foi um erro
jurídico, daí concluímos, não ter sido mantida a sua custódia cautelar.
Na época de Júlio César, a Justiça
romana condenava sem demora os que matavam seus pais. Os parricidas e os
matricidas eram metidos vivos dentro de um saco de couro,
na companhia de um galo, de um cão, de uma víbora e de um macaco. Tomadas
estas providências, os executores da lei jogavam o saco no mar. Aqui no Brasil
a nossa Justiça, sob tal aspecto, não é tão rápida e sumária...
O rosto de Suzane
Louise von Richthofen é belo, porém o
seu olhar é frio como o de uma serpente. Quando soube que o STJ lhe havia concedido o habeas corpus, ela disse à diretora da penitenciária:
-Está vendo, doutora, eu sabia que Deus ia me ouvir.
Não, não foi Deus que ouviu Suzane: foi o diabo.
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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a
glória e o martírio de Santos Dumont, lançado pela HaperCollins
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